Depois da ascensão e apogeu, só
poderia vir a queda.
Após a adaptação comecei a levar a
mesma vida do segundo ano. Como havia prometido ao fim da adaptação,
eu já tinha tirado o “recalque” com os calouros e não queria
saber de problemas.
Apesar disso, muita gente da minha
turma acabou sendo expulsa no início do ano por conta dos trotes,
como foi o caso do Alfenas e do meu comesa do primeiro primeiro,
Vigné.
O Calcinha vinha ditando a nova voga e
pelos colegas ficávamos sabendo das histórias de assédio moral. O
curioso era que ele resolvia implicar com pessoas que eram
relativamente tranquilas. Um dele era o Ricca. Ele nos contou que foi
chamado para conversar com o COMCA e ele contou a história dos
exército das comcubinas. Em resumo, para conseguir educar um
exército de comcubinas, o general cortava a cabeça de uma para
ganhar o “respeito” e obediência das outras. Enfim, o cidadão
lê “A Arte da Guerra” e acha o máximo pagar mistério para
subordinado. Mas enfim, uma característica do sistema que percebi
cedo foi que ele premia e promove os que assim agem.
Outro que recebia uma atenção
especial era o Teixiera Gama (Rodrigo). Por alguma razão obscura, o
Calcinha não o suportava. Ele havia prometido que enquanto ele
fosse COMCA, ele não ser formaria. O Rodrigo era um cara tranquilo,
a única coisa que você podia falar dele era sua apresentação, não
tinha saco para se manter alinhado. Mas como ele havia vários
outros, até piores, então porque a preferência? O que descobrimos
depois é que o irmão do Teixeira era da turma do Calcinha e eles
não se davam. Parecia que o Luiz Antônio estava descontando algum
recalque.
Os alunos viviam sendo chamados por ele
para prestar esclarecimentos. Em um deles, eu fui chamado. Entro na
sala, estava o COMCA e um oficial do quadro auxiliar que não gostava
de mim. Foi convidado a sentar e vem a primeira pergunta: “Renzo,
sobre trote, o que você tem a dizer?”. Como disse, depois da
adaptação eu estava muito sossegado. Mas depois da pergunta,
lembrei da adaptação e do episódio com o Biro Biro. Mesmo assim
respondi: “Não tenho nada a dizer, senhor”. Aí ele falou para o
oficial: “Coloque aí que ele não tinha nada a declarar”. Mas
felizmente, o tom da conversa foi suave. Ele havia recebido denúncia
de trote e como eu era o responsável pelo alojamento do primeiro
ano, ele queria saber se eu tinha ouvido algo sobre a ssunto. Mesmo que eu
soubesse, dedo duro nunca fui. Mas era sempre assim as conversas,
sempre jogando verde.
Nessa época as mães dos alunos do
primeiro ano criaram uma associação: “Associação de Mães
contra o Trote”. Elas viviam fazendo denúncias. E quando as
faziam, os oficiais perguntavam quem seriam os autores. E muitas
vezes meu nome vinha à tona, mesmo eu não fazendo nada, somente por
conta de eu ser o responsável do alojamento do primeiro ano. Em uma
dessas eu fui chamado pelo Tenente Anselmo para prestar
esclarecimentos. Ele falou que uma mãe tinha ligado e falado que eu
tinha dado trote no filho dela na terça-feira de madrugada daquela
semana. Refiz os meus passos e descobri que no dia eu tinha me
machucado no futebol e dormi na enfermaria, com toda a equipe médica
de testemunha lá. Enfim, tirando a adaptação, minha consciência
estava muito tranquila.
No meio daquele ano, fomos em um
churrasco na casa do Tenente Carlos Alexandre, que era responsável
pela equipe de futebol. Eu tinha começado a beber no segundo ano e
tomei umas cervejas naquele churrasco. Quando retornei ao alojamento,
quem estava de serviço era o aluno Anderson, conhecido pelo apelido
de Gazela. Ele era famoso por ser meio rebarbado. Aquela era uma
quinta-feira e eu estava arrumando minhas coisas para ir embora.
Mandei o Anderson ir buscar uma bolsa azul minha, ele acabou trazendo
uma maleta. Eu falei “Eu mandei você trazer uma bolsa azul e não
uma maleta preta”.
Ser truculento não era uma
característica minha, pelo contrário, eu era parceiro da molecada.
Mas o Anderson tirava todo mundo do sério. Acho que ele respondeu
alguma coisa que não me lembro e eu considerei que tinha sido
rebarbado. Estando meio alto por conta da cerveja, dei um empurrão
nele e mandei trazer a bolsa certa. Continuei arrumando minhas
coisas.
Então escutei uns barulhos no corredor
do alojamento. O aluno que estava de
serviço no banheiro estava segurando o Anderson, pedindo para não
fazer aquilo. Fui ver o que estava acontecendo e o Anderson estava
indo me denunciar ao Oficial-de-Dia. Analisando hoje, ele fez a coisa
certa. Mas no Naval daquela época, o que ele estava fazendo era
chamado de “spyar”, o que o tornaria um "spy" e sua vida não
seria fácil. Eu perguntei se ele realmente queria fazer isso, ele
disse que sim. Eu falei para ele fazer então, mas eu era arrogante
ao ponto de achar que ele desistiria no meio da caminho.
Dez minutos depois sou chamado pelo
Oficial-de-Dia Tenente Anselmo que me pergunta se eu tinha dado um
soco no aluno. Respondi que não, que tinha dado um empurrão. Ele
falou que não fazia diferença e me mandou ir dormir no alojamento
da minha turma naquele dia.
As consequências do ocorrido todo
mundo sabia: eu levaria uma parte e seria punido 10 dias de prisão
rigorosa após audiência com o Comandante do CN. Por outro lado, a
vida do Anderson também deve ter ficado ruim. Como eu tinha ficado
parceiro de vários primeiro anistas, alguns deles me confessaram que
durante algum tempo eles estavam dando “reunir” durante a
madrugada. Reunir consistia em juntar um grupo de alunos. Eles
levavam um cobertor, cada um segurava em uma ponta e enquanto o jovem
estavam dormindo, o usavam para prendendê-lo na cama enquanto os outro
batiam. Eu falei para eles pararem com aquilo, não por que eu
achasse isso incorreto na época, mas porque aquilo poderia me
prejudicar ainda mais.
Enfim, levei a parte e fui para a
audiência com o Comandante Guilherme. Na audiência, ele me falou
que meu nome era levantado constantemente em denúncias de trote. Eu
disse a verdade, que todas eram falsas e contei o caso de quando fui
interrogado pelo Tenente Anselmo. Mas enfim, no oficialato ninguém
mais me conhecia como antes, como na época do Tenente Alexandre e
Comandante Cardoso Gomes. Como todo já esperavam, levei 10 “rigs”.
E da mesmas maneira que o Universo
conspira em seu favor quando você Quer, ele começa a conspira
contra quando a auto-confiança se confunde com arrogância. Certo
dia eu tinha estava com alergia e tomei o xarope Polaramine. O médico
tinha me falado que ele dava muito sono, então coloquei meu nome
para que o ronda me acordasse. Ele não me acordou e eu levei 3
detenções por conta disso.
No dia seguinte, mesmas coisa, esqueceu
de me acordar. Só que dessa vez eu acordei com o Imediato do Corpo
de Alunos acendendo as luzes do alojamento. Eu já estava tão
desesperado para não tomar parte que fui para a janela do alojamento.
Mesmo sendo o primeiro andar, até o chão deveria ter uns 5
metros de altura. Segurei no cabo do para-raio e desci por ele, indo
me esconder na subida da caixa de água.
Naquele tempo estavam acontecendo
muitos roubos no alojamento e o Melo não estava encontrando seu ferro
de passar. Como a situação já estava ficando insuportável,
ele foi falar com os oficiais na sexta-feira, na hora da formatura para liberaração. Todo
mundo ficou muito puto com ele, porque isso atrasaria a ida para a
casa. Então resolveram revistar as malas dos alunos e em vez de
encontrarem ferro, encontraram um monte de carteiras de Marinha com
os alunos do primeiro ano. Por fim, o Melo descobriu que tinha
colocado o ferro em outro lugar e o pessoal ficou desarrumando a cama
dele por umas duas semanas por conta do ocorrido.
Mas as carteiras chamaram atenção e
começaram a interrogar os calouros para saber o que estava
ocorrendo. Chegaram então à fonte, o Sérgio. Eu e ele fomos
os únicos a passarmos no Colégio em Santos no ano de 99, sendo que eu já
o conhecia antes, quando fizemos Kick Boxing no Sírio Libanes, clube
da cidade. Então o Calcinha empregou sua técnica de coerção,
falou para o Sérgio dedurar quem mais estava fazendo comércio a
bordo e, caso contrário, a punição dele seria bem pior,
possivelmente expulsão.
Então o Sérgio entregou todo mundo
envolvido em comércio, desde a adaptação. Na segunda-feira logo
começaram a chamar todo mundo envolvido. Como eu disse no post
anterior, como era de praxe, eu tinha vendido camisas durante a
adaptação e estava esperando a hora de eu ser chamado. Isso seria
muito ruim para mim, pois com 10 rigs nas costa, eu não ficaria de
conselho no fim do ano. Agora se eu levasse mais 10, a coisa ficaria
complicada.
Mas o fato é que ninguém me chamou,
depois eu soube que o Sérgio denunciou todo mundo, menos a mim. Mas
de toda forma, muita gente tinha sido chamada e eu achava que
possivelmente chegariam a mim. Nesse dilema, conversei com o Caldas e
depois também lembrei do que minha mãe sempre dizia: “Quem conta
a verdade merece perdão”. Então decidi procurar o Tenente
Serafim e contar a ele, deixando a decisão sobre o que fazer em suas
mãos, na qualidade de único oficial que eu considerava ser integro
e justo. Ele estava de serviço e eu contei a ele que tinha vendido
camisas. Ele se mostrou decepcionado e falou pra eu me apresentar ao
COMCA.
Todo mundo envolvido com comércio
estava lá. Ao me ver, o Calcinha perguntou o que eu estava
fazendo lá. Eu disse que estava me apresentando por também estar
envolvido. Ele mandou eu esperar no corredor com os demais que ainda
seriam interrogados.
Entramos na sala um a um e contamos o
que fizemos. No meu caso, vendi camisas durante a adaptação.
Contudo, o COMCA estava também interessado em saber se tínhamos
obrigado os alunos a comprar. Falamos que o comércio sempre ocorreu,
mas nunca foi obrigatório, ou seja, contamos a verdade.
Na semana que se seguiu alunos do
primeiro ano começaram a ser ouvidos. Reparando que o COMCA estava
começando a procurar pêlo em ovo, peguei um exemplar do Regimendo
Interno do CN para saber até onde ele poderia ir. Descobri nele que
dado um certo acontecimento, você poderia tomar apenas uma parte por
ele. No mais, as demais condições deveriam ser lançadas como
agravantes ou atenuantes. O lado bom disso é que a penalidade máxima
por uma parte seriam 10 dias de prisão rigorosa.
Mas é óbvio que o Calcinha sabia
disso também e fez sua cama de gato: me deu 3 partes. Uma por
comércio a bordo, outra dizendo que eu tinha brigado os alunos a
comprarem e outra que eu nem lembro a razão. Mas aí vem a auto
confiança do cara que tinha conseguido tudo até então. Ponderei
com ele que aquilo não estava correto, que deveria tomar parte
somente por comércio e ele deveria lançar as outras duas como
agravantes. Além disso, falei que era para ele lançar o fato de eu
ter me apresentado voluntariamente como fator atenuante.
Se eu pudesse voltar na tempo, eu daria
um tapa em mim mesmo para dizer: “Acorda Zé Mané”. Um aluno
contestando um Capitão de Corveta? Só sendo muito inocente mesmo
para pensar que disso poderia sair algo positivo. Mas eu acreditava
em justiça, que por mais boçal que um oficial pudesse ser, ele não
poderia ir contra às regras. Ledo engano. Obviamente que ele
simplesmente cagou na minha cabeça. Me mandou para audiência com o
Comandante do Colégio com 3 partes nas costas.
Então eu poderia levar até 30 dias de
prisão rigorosa, 10 por cada parte, e isso seria um problema. Acabei
levando 13 e assim eu me tornava o recordista de prisões até então
com 23, somando as 10 que já tinha levado por conta do ocorrido com
o Anderson. Só fui superado já no fim do ano, quando o Rodolfo
conseguiu somar 24 rigs.
Comecei então a cumprir a pena. Mas
durante ela ocorreria o nosso baile de integração. Era praxe nos
anos anteriores os alunos terem a pena suspensa para comparecerem ao
evento. Mas não sob a administração do Calcinha. Ao conversarmos
com ele, não fomos liberados e, mais do que isso, ele nos falou que
a culpa de não irmos era nossa por estarmos no lance.
Mas eu não ia desistir fácil, como
disse, a arrogância era muito grande. Me dirigi então ao Serviço
de Orientação Educacional (SOE) e conversei com psicóloga Patrícia
Pontes. Ela intercedeu junto ao COMCA, mas não obteve sucesso.
Apenas como parêntesis, parece que depois os dois tiveram algum
envolvimento amoroso. Mas voltando ao assunto, me lembro que o
Giacomo também estava preso e sua mãe era advogada. Tentei juntar
todos o presos para entrarmos com uma liminar na justiça para irmos
ao baile. Os mais espertos falaram que não iam querer entrar nessa,
mas mesmo assim eu segui em frente.
A mãe do Giacomo entrou em contato
com o Calcinha, mas rapidamente retornou dizendo que era
melhor ficarmos quietinhos, que o COMCA era um maníaco. Enfim,
perdermos o baile que era um dos melhores eventos do CN. Naquele ano,
ele ocorreu na Marina da Glória.
Depois de uma semana de punição,
chegou a época da NAE. Depois do ocorrido com o baile, eu
sinceramente não queria ir. Isso porque para a competição
suspenderiam nossa punição. Achei isso uma tremenda hipocrisia:
para o baile não fomos liberado, mas para uma competição esportiva sim.
Mas nessa situação, achei melhor participar. Seria uma chance de
ganhar alguns pontos de conceito, além de eu adorar jogar bola.
Mas quando a coisa começa a desandar,
não tem jeito. No jogo contra a EPCAR, no primeiro lance que recebi
uma bola, um meia adversário me acertou uma porrada. Não contente,
disse que ia me bater o jogo inteiro. Como bom baixinho folgado, eu
falei que duvidava e quando fui marcar ele, pisei no seu calcanhar.
Ele ficou muito puto. No próximo lance que recebi a bola ele veio
babando. Mas quando eu dei o drible, ele meteu a mão na minha cara.
Eu cai e fiquei no chão até ele receber o vermelho. Eu ia continuar
deitado, mas o restante do time dele começou a querer me chutar no
chão. Recebi cartão amarelo. Enfim, pelo menos um eu expulsei.
Mas então logo depois houve um lance
mais ríspido com outro jogador e eu também fui expulso. O Fofão
disse que tinha se arrependido em não ter me substituído. Logo no
finzinho saiu uma falta pra eles no entrada da área, que foi
convertido em gol e logo depois o jogo terminou. O Comandante do CN
foi convidado a dar as medalhas e nos cumprimentar. Quando passou por
mim, disse que eu tinha que aprender a não perder a cabeça. Ele
estava certo. Em vez de eu ganhar pontos de conceito na NAE, acabei
perdendo mais ainda.
Voltamos ao CN e continuamos cumprir
nossas penas. Uma das coisas que tínhamos que fazer no fim de semana
era nos apresentarmos para o café às 8 da manhã. Eu já estava
totalmente na merda, então quando era 7:45 eu já estava lá. Teve
um dia que o Tenente Fuzileiro Lincolm era quem estava de
Oficial-de-Dia, mas ele não veio às 8 horas. Presumo eu hoje que o
serviço era coçado e os oficiais davam uma acochambrada, porque era
comum eles cagarem o pau assim. Eu tinha pego um livro do Rodrigo,
Senhor dos Anéis Completo, para passar o tempo e fiquei lendo lá em
baixo até 9 horas, esperando o toque para os presos. Depois de uma
hora de espera, chegamos à conclusão que, como muita ocorria, ele
não viria mais.
Tomei café, fui para o alojamento e
fiquei lendo em uma cama no fim do alojamento, por conta da
claridade. Então umas 10:30 ele tocou o sinal para os presos. Mas
quando urubu está de azar, o de baixo caga no de cima. Eu não ouvi o
sinal e como estava no fim do alojamento, nenhum colega me viu para
poder avisar. Quando deu a hora do almoço me avisaram que o Lincoln
queria falar comigo. Expliquei a ele ocorrido. Disse que estava lá
no horário padrão e ele não, depois fiquei lendo e não ouvi o
toque. Ele respondeu “Não interessa, na hora que o sinal toca que
você tem que vir”. Cara, eu queria explodir e mandar ele tomar no
cu. Mas eu já estava tão anestesiado com as merdas que estavam
acontecendo, que disse “Sim senhor, o senhor está certo, a culpa é
minha e eu mereço a parte”. Acho que ele ficou com pena e não me deu aquela parte
de ocorrência, mas infelizmente na época eu não entendi que essa
deveria ser a postura em um ambiente hierárquico como o quartel ou
uma empresa. Ou seja, se o seu superior está sendo um babaca, você
tem que reconhecer que você está errado e ainda o agradecer por
isso. Mas eu ainda precisava levar mais umas cacetadas para aprender
isso.
Chegou nosso conceito no fim do ano e o
meu foi 1,5 em 10. Isso significava que eu iria para o Conselho de
Ensino, onde decidiriam se eu continuaria ou não na Marinha. Todos
os anos ele ocorria no fim do ano letivo. Mas não naquele, não
esqueça do nosso maquiavélico COMCA Calcinha. Ele marcou o conselho
para dia 18 de dezembro, seria feito inclusive depois da nossa
cerimônia de formatura, feita na Escola Naval e depois do baile
também.
Durante esse baile de formatura, que
acho que foi por volta de 15 de dezembro, quando eu conversava com
amigos, eu dizia que não sabia se iria para EN por conta do
Conselho. Mas todo mundo me tranquilizava, dizendo que eu ia sim, que
eu era um cara na marca, que só tinha dado uns vacilos no terceiro
ano. Para ser sincero, a minha auto confiança era grande e eu também
não tinha dúvidas que iria para a EN. Diferente de muitos, aquilo
era o que eu queria para minha vida. Só que a distância entre auto
confiança e arrogância é muito pequena.
Minha mãe se ofereceu para ir para
Angra comigo para me apoiar. Eu respondi que não precisava, que tudo
ia ocorrer bem, eu tinha certeza. Na primeira parte do conselho, nós
contávamos nossas vidas para os oficiais do corpo de alunos: COMCA,
seu imediato e aos oficiais comandantes de companhia. Assim eu fiz e
me lembro de eu dizer mais do que deveria, principalmente com relação
ao eu ter pedido à mãe do Giacomo para interceder no caso do Baile.
Tudo isso por conta dos verdes que o Senhor Luiz Antônio jogava.
Depois disso, com todos os depoimentos,
todos os casos seriam levados pelo COMCA para apreciação de todos
oficiais do CN: Comandante, Imediato, Oficial Médico (Oscar Passos),
SOE e os demais oficiais da primeira fase. O problema disso era não
ter direito a defesa, sendo COMCA a pessoa a fazer o papel de
advogado de defesa. Era óbvio que isso só poderia dar merda,
realmente eu era muito inocente.
Depois de 4 horas angustiantes, vem o
resultado proferido pelo COMCA de forma objetiva (Só não lembro
todos os nomes do que safaram): “Alan Viana, Brito e Rodolfo vão
para Escola Naval. Os demais, me acompanhem para assinar seus
documentos de saída da Marinha”. Cara, meu mundo ruiu naquele
momento. Foi uma mistura de sentimento: ódio contra o COMCA
acompanhado da vontade de sentar a porrada ou, melhor ainda, um tiro entre os olhos; desespero de não saber o que seria da minha
vida e evoluindo até o delírio de imaginar que aquilo era só uma
brincadeira e que ele deveria reler a lista, pois meu nome deveria
estar lá.
Liguei para casa, avisei minha mãe:
“Acabaram de me mandar embora da Marinha”. Meu velho, dizer isso pra
ela foi o pior de tudo. A vergonha que eu senti naquele momento foi
indescritível. Me senti um merda e ficamos em silêncio no telefone
por cerca de 1 minuto. Falei então que ia desligar, ver o que teria
que fazer e voltaria para a casa.
Ao chegar na sala do COMCA o Calcinha
queria que assinássemos os documentos. O Máximo liderou a revolta,
dizendo que não ia assinar pois assim tinha sido instruído por seu
advogado. O Calcinha ficou possesso, falou que não interessava
porque mesmo não assinando, havia testemunhas, então daria na
mesma. O Máximo replicou dizendo que se não tinha diferença, então ele não
precisava insistir na assinatura.
Ninguém assinou e arrumamos nossas
coisas para retornarmos para casa. Olhando na época e hoje também,
a maioria que não foi permitida a ir para EN tinha cometido seu
pecados, inclusive eu. Mas sinceramente, duas entraram totalmente de
gaiatos: o Rodrigo e o Coxinha. O Caso do Rodrigo eu já comentei. O
do Coxinha, seu grande pecado foi não conseguir passar na aptidão
física. Só o que ele pediu foi para darem a ele o diploma do
segundo grau, nem queria ir para EN. Mas enfim, era o Calcinha quem
decidia, então nem preciso dizer qual foi a resposta.
Na viagem, não sei como não bati o
carro. Eu ficava pensando em como seria entrar em casa, toda a
vergonha na frente da minha mãe e o esculacho que ia levar. Mas minha mãe foi do caralho. Quando cheguei ela só me
confortou. No meio tempo, ela contou para o Bruno, aluno da Epcar que
eu tinha conhecido 2 anos antes em viagem para Porto Seguro. Ele
disse que a tia era advogada e poderia interceder em nosso favor.
Enfim, a luta ganharia mais alguns rounds.
Hoje em dia, cheguei em algumas
conclusões sobre o ocorrido:
1) Anderson: você era um dos caras
mais sãos naquele sistema que gerava uma total inversão de valores.
Quando conversamos durante um baile na EN você veio me pedir
desculpas. Eu disse que eu que tinha que me desculpar e isso não era
demagogia nenhuma, era realmente o que eu pensava e penso.
2) Calcinha: já o agradeci
pessoalmente pelo episódio e depois chego nessa parte história. Mas
aproveito para agradecer de novo. Não fosse você, eu não teria
aprendido a lidar com pessoas, independente de o quão boçais elas sejam, principalmente quando elas tem poder e
autoridade sobre você.
Sobre ser expulso, eu penso de duas
maneira:
1) No fim eu tive o que merecia por
tudo o que fiz durante a adaptação e pela arrogância de não
abaixar a crista mesmo quando estava claro que eu ia me ferrar.
Nunca eu deveria ter tratado um subordinado como tratei o Anderson.
2) Por outro lado, levando apenas em conta as razões de eu ter sido julgado: empurrar um aluno e vender camisas,
chego à conclusão que aquilo foi uma injustiça. Isso seria coisa
normal para um jovem de 19 anos e eu era inocente de acreditar que
no mundo havia justiça, que as coisas deveria ser feitas da maneira
correta pelas autoridade e que todos seriam julgados pela sua
competência e seus atos. Me julgaram apenas pelos meus
pecados no terceiro ano e não consideraram o trabalho duro que
tinha feito nos dois primeiros, quando eu tinha uma ficha
disciplinar ilibada.
Mas mais importante que tudo isso, hoje para
mim não interessa se foi ou não injustiça, águas passadas não
movem moinho e eu aprendi a só extrair bons ensinamentos de tudo que
ocorreu.
A continuação dessa história fica
para outro post. Por enquanto, coloco algumas fotos do CN da época
de terceiro ano.
Abs,
Renzo Nuccitelli
|
Eu e o Biro Biro. |